quinta-feira, 26 de abril de 2012

O ProUni: uma articulação entre educação, trabalho e juventude | Parte 2

“Não queremos mais desperdiçar as grandes mentes brasileiras excluídas dos bancos escolares!”



Artigo de Fabiana Costa

Um retrato dos bolsistas do ProUni

Partindo de uma visão dos alunos bolsistas da PUC-SP, bem como dos alunos matriculados em várias instituições de educação superior na capital de São Paulo, agrupamos os dados em algumas categorias. São elas: perfil do aluno bolsista, categoria socioeconômica, vida acadêmica e visão sobre o Programa.


A PUC-SP possui, conforme dados do segundo semestre de 2007, 20.198 alunos matriculados somando os cursos de graduação (15.776) e pós-graduação (4.422). Do total de alunos de graduação, 815 (5,16%) são bolsistas do ProUni.


Distribuímos o perfil dos estudantes bolsistas do ProUni nas seguintes subcategorias: gênero, idade, curso e local de moradia.




1.1. Gênero


Conforme dados do INEP, do total de alunos matriculados em 2005 na educação superior as mulheres representavam 55,9%. Na sociedade brasileira, esse número cai para 51,3%. Dentre os ingressantes e concluintes, as mulheres também se destacam: das 55% que entram na universidade, 62,2% conseguem concluir, enquanto que o percentual entre os homens é de 45% de ingressantes e 37,8% de concluintes. Entre os homens há, portanto, uma evasão educacional significativa .


Na PUC-SP, segundo os dados levantados para a pesquisa, as mulheres também aparecem com destaque, representando 51,5% dos alunos beneficiários do ProUni em 2006.

1.2. Idade


Segundo levantamento dos questionários gerais do 1º Encontro Municipal dos Estudantes do ProUni de São Paulo, 60,1% dos alunos possuem faixa etária entre 18 e 24 anos. Na PUC, dentre os alunos pesquisados a faixa etária entre 18 e 24 anos é de 72,22%. Esses dados confirmam que a maior parte do público atingido pelo programa é composta de jovens.


1.3. Curso


O critério de disponibilidade de vagas no ProUni na PUC-SP é calculado em função do número total de alunos matriculados pagantes, conforme prevê a Lei nº 11.096/05: “(...) 1 (uma) bolsa integral para cada 9 (nove) estudantes regularmente pagantes e devidamente matriculados ao final do correspondente período letivo anterior” . Nesse sentido, os cursos com maior número de alunos possuem proporcionalmente também o maior número de bolsistas.


Na PUC-SP, conforme dados obtidos referentes aos alunos matriculados em 2007, dos 815 alunos matriculados 21,8% estão cursando Administração e 15,8% Direito. Esses dois cursos concentram 37,6% das matrículas dos bolsistas na PUC-SP.

1.4. Local de moradia


Do total de 815 bolsistas do ProUni da PUC-SP, 56,1% residem na capital de São Paulo. Os demais residem em cidades localizadas na grande São Paulo, havendo ainda casos de alunos residentes no interior do estado.


Tendo como base o endereço residencial dos bolsistas da capital, fizemos o cálculo, a partir da página eletrônica Google Maps, da distância entre o local de estudo – adotando como referência o campus central da PUC-SP, localizado na Rua Monte Alegre 984, Perdizes – e o local de moradia.


Os resultados revelam que a maioria (80,8%) dos bolsistas moram à distância de 10 a 30 quilômetros da universidade. Esses dados comprovam que os bolsistas residem, em sua maioria, em bairros distantes da instituição. A cidade situa-se numa área de 1.509 km2, e, se considerarmos a complexidade desta metrópole, com população de 10.886.518 (IBGE/2007) e mais de 6 milhões de veículos, podemos deduzir que se trata de uma distância considerável, principalmente em razão das dificuldades de deslocamento.


2. Categoria socioeconômica


Para analisar a categoria socioeconômica utilizamos dados do ENADE (2004, 2005 e 2006) dos alunos bolsistas e não-bolsistas da PUC-SP, bem como as respostas aos questionários dos alunos bolsistas da instituição. Dividimos essa análise nas subcategorias renda mensal, mercado de trabalho e escolaridade dos pais.


2.1. Renda mensal


Segundo os dados do ENADE sobre os alunos bolsistas e não-bolsistas da PUC-SP, 31,7% dos bolsistas possuem renda familiar de até 3 salários mínimos; já entre os não-bolsistas esse índice é de 6,7%. Na faixa de 3 a 10 salários mínimos, o índice dos bolsistas é de 48,4%, e dos não-bolsistas de 25,4%. Na faixa acima de 10 salários mínimos a diferença se inverte: os bolsistas chegam a 20%, enquanto os não-bolsistas somam 67,9%. Tais dados confirmam que o ProUni atende a uma parcela da juventude de mais baixa renda.

2.2. Mercado de trabalho


Mais de metade dos alunos entrevistados passou a exercer algum tipo de atividade profissional após o ingresso na universidade. O estágio aparece com destaque entre as ocupações. Esses dados são reveladores do quanto o aluno passa a ter melhores oportunidades pelo fato de estar cursando uma universidade. Se considerarmos o estágio e o emprego remunerado, teremos o índice de 75,4% de estudantes com alguma fonte de renda.


2.3. Escolaridade dos pais


Em relação à referência familiar dos alunos bolsistas da PUC-SP, constatamos que muitos deles são os primeiros de suas famílias a cursar uma universidade.


Temos como referência o grau de escolaridade dos pais, que em grande parte não possuem curso superior. Dos alunos bolsistas, somente 6,3% possuem pais com graduação; já entre os não-bolsistas esse índice sobe para 67%.


3. Vida acadêmica


As questões referentes à vida acadêmica dos alunos bolsistas aparecem em vários momentos. Entretanto, selecionamos alguns aspectos relevantes que surgiram com mais frequência para facilitar nossa análise. Dividimos essa análise nas seguintes subcategorias: acesso, permanência, desempenho e currículo.

Acesso


O principal objetivo do ProUni consiste em garantir o acesso à universidade àqueles que dificilmente teriam essa oportunidade em função de diversos obstáculos. A relação candidato/vaga em relação ao ProUni na PUC-SP é de 37,3 candidatos por vaga, conforme dados do Expediente Comunitário no processo seletivo de 2008. Portanto, além das dificuldades que normalmente existiriam em ingressar numa universidade pelos mecanismos tradicionais de seleção, esses alunos enfrentam ainda uma barreira de seleção relacionada ao PROUNI.


3.1. Desempenho e currículo


Em relação aos currículos, a visão dos alunos bolsistas equipara-se à dos não-bolsistas da PUC-SP. Ambos os grupos o consideram bem integrado, havendo clara articulação entre as disciplinas, conforme dados do ENADE.


Ao analisarmos o rendimento dos alunos bolsistas, mesmo considerando as dificuldades já apresentadas constatamos haver um ótimo aproveitamento do curso, já que, do total de alunos matriculados em 2005 e 2006, somente 6% foram reprovados nas disciplinas cursadas; 30% estão dentro da média e 64% apresentam rendimento acima da média, conforme dados obtidos no Expediente Comunitário da PUC-SP.


Várias opiniões divergentes permearam o debate sobre o ProUni logo que esse programa foi anunciado, em 2004. Alguns mitos foram fomentados por parte de setores contrários à proposta. O principal deles era o de que, por serem oriundos de escolas públicas, os alunos bolsistas não estariam à altura dos conteúdos aplicados nas instituições de educação superior, gerando certa defasagem e, por conseguinte, a redução da qualidade do ensino.


Na contramão dessa visão distorcida, os dados verificados revelam que os bolsistas possuem rendimento escolar equivalente e, em alguns casos, superior ao dos demais ingressantes pelo sistema tradicional do vestibular. Esse rendimento em muito se deve ao maior empenho dos alunos do ProUni, que abraçam a oportunidade antes impensada de ingressar na universidade e se dedicam mais aos estudos, obtendo bom aproveitamento nas disciplinas. Além disso, conforme demonstrado anteriormente, esses alunos passam por uma seleção muito concorrida, fato atestador de que não conquistam a bolsa sem obstáculos ou sacrifícios.


4. Visão sobre o ProUni


A avaliação dos alunos bolsistas em relação ao ProUni é muito positiva. Entre os alunos que responderam aos questionários no Encontro, tivemos uma excelente avaliação do programa: 94,96% dos estudantes o consideram bom ou ótimo.


Em relação à PUC-SP, 77,7% dos 18 alunos que responderam ao questionário consideram o programa entre bom e ótimo.

Melhorias/Reivindicações


Em relação a melhorias e reivindicações, temos como referência alguns pontos da Carta Aberta ao Exmo. Sr. Ministro da Educação Fernando Haddad. Nesse documento são listadas as seguintes necessidades: mais informações; critérios mais claros para a perda da bolsa; fim da comprovação de renda anual. Além disso, surge ainda o aspecto de uma maior fiscalização nos critérios para a concessão de bolsas. No geral, é também possível notar que as reivindicações se aproximam ou se diferenciam em razão da realidade e das demandas específicas de cada instituição de ensino superior.


Conclusões: o olhar do pesquisador


Ao longo da pesquisa percorremos um longo caminho, permeado pela análise de documentos e por reflexões, debates, diálogo com os estudantes, com o meio acadêmico e com o poder público. Buscamos analisar o Programa Universidade para Todos (ProUni) sob a ótica dos beneficiários – em especial os bolsistas da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Tentamos identificar suas opiniões, expectativas e dúvidas em relação à política pública em questão.


O estudo buscou identificar os principais aspectos positivos e negativos relacionados ao Programa Universidade para Todos, destacando seus objetivos enquanto política pública com o intuito de ampliar o acesso à educação superior, e que já atendeu mais de 800 mil estudantes em todo país.


A proposição de uma política pública educacional como o Programa Universidade para Todos é fruto de uma série de reivindicações dos setores ligados à educação, que há anos debatem a necessidade da ampliação de vagas na educação superior.


Em vários documentos oficiais há um reconhecimento da demanda de acesso à educação superior. Tal reconhecimento é reforçado através das publicações científicas de pesquisadores, das entidades ligadas à área educacional e dos documentos oficiais do governo federal.


A implementação do ProUni evidencia a necessidade de atender uma parcela da população que, por razões diversas, inclusive de cunho socioeconômico, encontra-se excluída da universidade.


O Programa é um primeiro passo no sentido de garantir o acesso à universidade – não apenas, diga-se de passagem, aos jovens, mas também a todos aqueles que tiveram seu sonho de cursar uma graduação adiado por anos, e que agora finalmente possuem essa oportunidade. No universo da pesquisa, 10,46% dos estudantes tinham mais de 31 anos. Esse fato demonstra que o Programa abre perspectivas não só para os jovens, mas também para uma outra parcela importante da sociedade.


Os estudantes reconhecem a importância do programa:


Registramos aqui, com convicção, que a grande maioria de nós não estaria na universidade se não fosse através do ProUni. O recorte social que ele garante inclui uma parcela da população que não teria acesso a uma vaga pública e muito menos às mensalidades praticadas nas instituições privadas. Muitos de nós, com idade já mais avançada, havíamos perdido a expectativa de concluir uma graduação e agora voltamos aos bancos escolares retomando esse antigo sonho




Ao longo de nossa pesquisa, nos diálogos com os alunos bolsistas do ProUni, percebemos que não se sentiam diferenciados ou inferiorizados em relação aos demais alunos não-bolsistas da PUC-SP. Existe uma clara consciência de que são sujeitos usufruindo de uma política pública de acesso à universidade, e que o fato de estarem nela é um direito conquistado. Em nenhum momento percebemos um sentimento de inferioridade ou mesmo de discriminação, a não ser em função das dificuldades socioeconômicas. Grande parte dos alunos da PUC-SP destaca um aspecto do ProUni que precisa ser aprimorado – a ampliação do número de bolsas-permanência.


Conforme relatos coletados no decorrer da pesquisa, o ingresso na universidade representa para esses alunos – além da possibilidade de adquirir uma melhor formação profissional – uma nova perspectiva de ampliar seu universo de conhecimentos e suas relações sociais. O curso de graduação também representa um instrumento de ascensão social, através do ingresso dos estudantes no mercado de trabalho.


A juventude tem um papel estratégico no desenvolvimento do nosso país. Ao falarmos de crescimento e desenvolvimento econômico, temos que levar em conta a trajetória e a participação dos jovens na economia e no mercado de trabalho.


O Brasil está vivenciando um processo denominado de bônus demográfico, que se constitui com o aumento do contingente de pessoas em idade produtiva. Há uma redução do peso das crianças e dos idosos na economia, conseqüentemente ampliando o peso dos adultos no setor produtivo. Segundo o IBGE, esse fenômeno não ultrapassará o ano de 2030, e só acontece uma vez em cada país. Atualmente no Brasil, há 51 milhões de jovens entre 15 e 29 anos.


Com essa nova realidade social, é preciso ver a juventude para além da inclusão e participação. É necessário criar condições e prever políticas públicas de juventude que vise o desenvolvimento, a inserção no mercado de trabalho e ampliação da distribuição de renda no Brasil.


A educação constitui-se em tema central para o desenvolvimento social e cultural dos jovens brasileiros, e o ingresso das camadas menos favorecidas de nossa juventude certamente servirá de instrumento para que se possam conhecer, implementar e anunciar mudanças significativas no sistema educacional brasileiro.


O Programa Universidade para Todos surge como uma dessas mudanças – que ainda necessita de aprimoramento e ampliação, no intuito de garantir que mais jovens possam ter acesso à universidade, como forma de inverter uma realidade muito aquém das necessidades educacionais de nossa juventude.


Tivemos o contato com a primeira geração que teve o direito de ingressar numa universidade através do ProUni. A educação é um tema caro atualmente no Brasil, e a implementação de políticas que permitam aos jovens sonhar com um futuro melhor nos desafia e motiva. Como afirma o documento final do 1º Encontro Municipal dos Estudantes do ProUni de São Paulo, “Não queremos mais desperdiçar as grandes mentes brasileiras excluídas dos bancos escolares!”. Esse é o desafio de toda uma geração!


Fabiana Costa | Mestre e doutoranda em Educação: Currículo da PUC-SP; Vice-presidente da UNE – gestão 2003-2005.
1. Perfil do aluno bolsista

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