segunda-feira, 11 de maio de 2009

Deus existe - os marxistas sabem religiâo?

A maioria esmagadora da população mundial é teísta. Porém, os tipos de credos são extremamente diversificados. A democracia ocidental buscou defender a pluralidade e definiu que o Estado deve ser laico, respeitando a todos igualitariamente, independente do posicionamento religioso (embora na prática nem sempre este princípio funcione). Não foi fácil conseguir separar Estado e religião. Trabalhadores, estudantes, intelectuais sofreram perseguições ao longo de todo este processo. Sabe-se que a igualdade social, sempre foi bandeira da esquerda. Ora, muito nos surpreende então que exista uma parcela autoritária dentro da dita esquerda que afirme: o Estado deve exercer um confessionalismo às avessas, tornar-se ateu! É preciso que abramos os olhos, pois, ao nosso redor estão lobos fantasiados de ovelhas, dizem que falam em nome da liberdade, mas na verdade querem tornar-nos prisioneiros de um Estado autoritário.

Os esquerdistas carrancudos, nada dialéticos e muito dogmáticos, não se atualizam com o passar dos anos. Preferem gritar chavões e frases de épocas passadas. Gostam de dizer: “O primeiro requisito da felicidade dos povos é a abolição da religião.”, mas estão longe de se deparar com a complexidade que é estudar o fenômeno religioso. Entregam-se ao pensamento simplista: “religião é ruim, então vamos destruí-la”, sem qualquer argumentação e reflexão própria. Ou seja, são meros parasitas, inatualizáveis, do passado.

Enquanto vários religiosos estudam a filosofia marxista, o movimento inverso pouco acontece. Raros são os marxistas que analisam a filosofia cristã. Porém, a união entre as duas correntes ainda está em construção e já rendeu bons frutos à América Latina. Pode-se exemplificar citando o guerrilheiro urbano Carlos Marighella, o qual apoiou-se em freis dominicanos; e a guerrilha nicaragüense, que eliminou a ditadura dos Somoza graças à união entre marxistas e cristãos.

As bases éticas de nossa sociedade, inclusive da esquerda, gostem ou não algumas pessoas, são religiosas, majoritariamente cristãs. Os princípios fraternos e a opção pelos pobres se popularizaram através do cristianismo. Atuais certezas constitucionais como a punição ao homicídio e ao roubo existem, também, graças às religiões. Ou seja, religião é algo além da adoração a um ser desconhecido, ao impossível, é um conjunto de normas éticas de convívio social, de respeito ao próximo e de serviço em sociedade. Religião é um fenômeno social extremamente complexo, que visa, como aponta o origem semântica da palavra, religar o ser humano a Deus. Mas, o que é Deus?

Para responder não interessa agora fazer uso de definições de minorias populacionais. Ou seja, não importa se os bispos católicos acham que Deus é um ser barbudo sentado em um trono ou se alguns militantes acham que é mero instrumento de dominação e alienação. Interessa, para definir, o que a maioria da população pensa sobre o assunto. Toda vez que populares oram, rezam ou se referem a Deus de alguma forma definem-no como: pai, amor, poderoso, criador, companheiro, protetor, salvador, libertador. Ou seja, cada um pode ver Deus a sua forma, mas existe um consenso na mentalidade popular que Deus quer dar amor, proteção, fraternidade, além de salvar e libertar o povo. Não existe uma convicção se Deus usa roupa branca, tem voz de trovão, barba comprida, porém o senso comum aponta que ele traz o bem e o amor à população e quer ver seu povo livre de todo o mal. Quando a esquerda marxista diz que não acredita em Deus, que a religião deve acabar, o povo entende que querem pôr fim a sua chance de religar-se ao amor, à fraternidade, justamente porque os intelectuais de esquerda, na maioria das vezes, não falam nem entendem a língua da população, apenas entendem a linguagem dos meios acadêmicos.

Incontáveis vezes a esquerda deixa a luta de classes em segundo plano para priorizar a censura ao pensamento religioso e, no mais insano dos surtos, alguns ditos marxistas perdem tempo tentando provar cientificamente a inexistência de um deus. Porém, mesmo que fosse possível provar tal inexistência isso em nada mudaria os religiosos, pois suas crenças não são movidas pelo racionalismo e sim por fé. A Bíblia define muito bem: “A fé é um modo de já possuir aquilo que se espera, é um meio de conhecer realidades que não se vêem.” (Hebreus11,1)

Diante desta afirmação, um espanto: marxistas e cristãos possuem novamente algo em comum, a fé, negada arduamente por alguns esquerdistas. O que é o comunismo se não uma realidade que não se vê? Por mais que Marx esteja acompanhado, em muitas afirmativas, pelo embasamento científico, sua esquemática de superação do capitalismo, nada mais é do que filosofia e, por que não, fé? Para que o comunismo de Marx torne-se uma ciência lhe falta existir, concretizar-se e, até hoje, nenhuma sociedade atingiu tal estágio de desenvolvimento.

Se o problema não é Deus, não é a fé, quem a esquerda vai culpar pela alienação dos religiosos? Claro, a Igreja!

A igreja enquanto instituição tem se mostrado através do tempo como um instrumento realmente conservador, porém sabe-se que desde a Idade Média esta tem perdido espaço no governo e, atualmente, está bastante fragmentada. Porém, existe outro conceito de igreja. Segundo a Bíblia somos nós o templo do Espírito, ou seja, os homens não precisam seguir a ditadura das instituições. Igreja é qualquer local onde existam pessoas seguindo os caminhos de Cristo, ora reunidas em uma casa, ora nas ruas ou em um movimento social. O que se incutiu na população foi uma interpretação equivocada do termo, a qual sustenta muitas empresas altamente lucrativas, mascaradas de templos de Deus.

Porém, interpreta-se a história de forma equivocada se vitimizamos sempre os que seguem e sustentam as mega-instituições religiosas. As pessoas têm certas liberdades de ir e vir, além disso, atualmente, podem escolher entre milhares de igrejas que existem. Ou seja, se acharmos que todos estão na igreja porque são alienados, tiramos o papel dos seres humanos de sujeitos históricos. Muitas pessoas estão nas igrejas porque acham proveitoso e recebem o que esperam, independente de isso ser bom ou ruim para a sociedade como um todo.

É interessante observar que os capitalistas têm a capacidade incrível de absorver de tudo, desde imagens do Che Guevara, até o discurso e as instituições religiosas. Enquanto isso, muitos militantes marxistas preferem transformar as obras de Marx em uma nova Bíblia.

Um exemplo de capitalista que tem tirado proveito na adaptação do discurso religioso é James Hunter, autor do best-seller O Monge e o Executivo. Nele, Hunter propõe uma nova organização das empresas, baseada no serviço cristão. Ou seja, os patrões deveriam atender certas necessidades dos empregados para serem bem servidos por estes. Isso nada mais é do que uma negação da luta entre capital e trabalho e banalização do serviço cristão. Hunter afirma que o patrão deve servir como Cristo para alcançar a retribuição do funcionário. Se isso não ocorrer o funcionário deve se dirigir a outra empresa em busca de melhores condições. O livro mostra um total desconhecimento da realidade dos países vítimas do neoliberalismo e mesmo da periferia dos Estados Unidos da América. O sucesso de empresas como o Mcdonald’s está longe de seguir esta fórmula. Além disso, o autor distorce os padrões evangélicos, como se Cristo tivesse vindo para realizar serviços de qualquer tipo a qualquer um. Perguntemos: Cristo passava o dia realizando milagres para o imperador Romano buscando uma boa convivência social? Passava o dia transformando água em vinho para os fariseus obterem um maior lucro nas feiras? Não, Cristo veio para servir os pequenos, sem que isso beneficiasse as camadas dominantes da população, essa é a filosofia cristã distorcida pelo dito best-seller. A vivência da luta junto aos excluídos converte-se em uma luta junto ao empresariado, dando apenas certos benefícios ao povo.

Os marxistas possuem suas verdades. Os cristãos também. Não existem verdades mais verdadeiras, nem melhores, nem piores. O que existem são diferentes pontos de vista, diferentes interpretações dos fatos e da sociedade. Ambos possuem verdades em comum: a destruição do capital como objetivo, uma sociedade fraterna, o fim da exploração do homem pelo homem, a construção de um mundo de paz. A união entre os dois grupos pode ser conseguida desde que o etnocentrismo e as divergências vigentes nos dois lados fique de lado para seguir por um caminho comum que leva a um novo mundo possível.

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